"Bebida é água, comida é pasto. Você tem sede de quê? Você tem fome de quê?" Lembro de escutar essa música nos anos 1980, no rádio, enquanto estava com meu pai no carro, e ele me perguntou o que eu achava que significava. Eu, pré-adolescente, fiquei ouvindo com atenção; entendia, mas não conseguia elaborar uma resposta. Meu pai percebeu o meu esforço e disse: "nem só comida é alimento". Essa frase deu mais um nozinho na minha cabeça. Mais tarde, me dei conta do quanto essas conversas que eu tive com meu pai e minha mãe ao longo da minha formação me nutriram profundamente. Durante esse primeiro setênio do Programa Maritaca, já parei algumas vezes para analisar o meu processo de criação, que costuma vir de forma tão inconsciente. Nesse sentido, uma das coisas que sempre penso é que o repertório cultural da criança é tão importante quanto o leque de alimentos que ela consome durante a infância (reservadas as devidas proporções, lógico, e pensando que quem me lê aqui não sofre grandes privações para colocar comida no prato dos seus filhos, que fique claro). Se eu só oferecer para a criança músicas infantis com arranjos pobres em sonoridade, ou com vozes infantilizadas (infelizmente isso existe aos montes), ela vai entender que música é isso. Seu "paladar auditivo" e sua sensibilidade serão prejudicados. Claro que isso pode ir mudando ao longo da vida, mas assim como não devemos dar doces processados para os pequenos até os dois anos, imagino que a mesma preocupação deveria existir em relação às outras influências sonoras e visuais para as crianças, que chegam muito limpas de qualquer veneno do mundo terreno. Nunca devemos esquecer que elas estão em formação, então quanto mais oferecermos "alimentos" variados e de qualidade, mais aguçado será seu paladar - em todos os sentidos. |
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