A grande ficha uma hora cai. E ela está caindo em todo lugar no mundo da tecnologia. As empresas do setor notaram que seus produtos, serviços e sistemas não só excluem negros e negras, como também reproduzem a lógica do racismo estrutural. Já contei aqui como Microsoft, IBM e Amazon puxaram a fila ao deixar de fornecer reconhecimento facial para autoridades policiais dos EUA. Agora, Facebook, Apple e o Linux ampliaram o movimento de uma forma inacreditável. Isso, porém, diz mais sobre elas do que as ações em si. O que rolou?Após um longo boicote, que fez empresas do porte da Coca-Cola, Disney, McDonalds e Starbucks deixarem de anunciar em suas plataformas, o Facebook tomou uma decisão. Estabeleceu um grupo para averiguar como e em que medida suas plataformas funcionam com base em vieses racistas. E isso tem tudo a ver com o incômodo das companhias com a rede social, afinal: - O Facebook permitiu durante anos que raça fosse usado como critério para distribuição de propaganda, além de?
- Ter uma postura complacente com grupos de ódio que pregam atos de violência contra a população negra. Isso sempre existiu, mas?
- A morte de George Floyd, asfixiado após um policial branco ajoelhar por oito minutos sobre seu pescoço, fez a situação se tornar insustentável. Tanto que?
- Seis organizações criaram o movimento "Stop Hate For Profit" (para de dar lucro ao ódio, em tradução livre), que pede ao Facebook para:
Tomar medidas enérgicas para impedir que suas plataformas sejam usadas para dividir nossa nação, suprimir eleitores e atiçar as chamas do racismo e da violência - Agora, as mudanças em gestação no Facebook têm o potencial de atingir seus 2,5 bilhões de usuários e o mais de 1 bilhão de pessoas que estão no Instagram. Além delas?
- Outra grande alteração atrás das cortinas é a que Linux e Apple estão fazendo na linguagem de programação. Acontece que?
- Algumas das aplicações mais usadas do mundo são escritas com termos que remetem à escravidão, como "blacklist" (lista negra), "master" (mestre) e "slave" (escravo). A ideia é que?
- Essa terminologia seja trocada por expressões neutras, que não possuam conotação carregada de dor e sofrimento para a população negra. Nessa linha?
- A Microsoft vetou o uso desses termos no Github, a maior plataforma de desenvolvedores do mundo.
Por que é importante?Apesar de tardia e motivada por uma clara pressão de quem paga a conta, as iniciativas são louváveis. Posto isto, é preciso admitir que os níveis de dificuldade não são equiparáveis. A missão de Apple, Linux e Microsoft é incomparavelmente mais simples que a do Facebook. Isso porque, parafraseando Tupac, as linguagens de programação vêm e vão, mas a história que elas contam podem ser eternas. Já conversei com um sem-número de engenheiros e cientistas da computação que aprenderam a programar com Cobol, linguagem de programação criada em 1959 para organizar bancos de dados, e não encontraram dificuldades para se adaptar ao mundo do Java, Python ou C++. O trabalho de Apple e companhia é quase que fazer uma revisão ortográfica e semântica desses dialetos digitais. Já a tarefa do Facebook é expurgar quaisquer vieses discriminatórios que rondem a rede social. E isso requer lidar com bancos de dados construídos em uma sociedade que funciona de jeito torto. Há séculos. Não é bem assim, mas está quase láFora depender de um reboliço social para conseguir dizer "missão dada é missão cumprida", o Facebook enfrentará dificuldades impostas pelo próprio Facebook. Segundo o jornal "WSJ", grupos de pesquisa internos quiseram averiguar em que grau os algoritmos disseminavam discriminação racial, mas não puderam atuar sem a autorização de um departamento que incluía Zuckerberg em pessoa. A pressão por fazer do site um lugar mais confortável para todo mundo parece causar certa tensão entre funcionários. Afinal, muitos deles sabem que ambientes pouco inclusivos não favorecem a livre circulação de ideias, algo crucial para a empresa. Qualquer viés nos nossos sistemas e políticas vão contra a ideia de fornecer uma plataforma que que todos possam se expressas Vishal Shah, líder de produtos do Instagram, disse ao WSJ A pergunta é: por que a guinada não veio antes? |
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