A decisão de uma ação judicial de um caso envolvendo a atriz Letícia Spiller suscitou discussões sobre cancelamento, fake news e liberdade de expressão. E é justamente sobre esse caso que trata a coluna de Carlos Affonso Souza, em Tilt, nesta semana. Tudo começou com uma entrevista concedida por Spiller a uma rádio, em 2020, logo após o estouro das denúncias de assédio sexual envolvendo Marcius Melhem, que coordenava o departamento de humor da Rede Globo. Sites de fofocas distorceram as falas da atriz com manchetes sensacionalistas. Com isso, a atriz buscou a remoção dos links para esses sites da ferramenta de busca do Google. O Google, por sua vez, alegou que não era responsável pelo conteúdo publicado por terceiros e que a ação deveria ser movida contra os autores das páginas. O juiz do caso inicialmente decidiu pela não concessão de liminar para a remoção dos links, mas o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), atendendo ao recurso da atriz, reconheceu a necessidade de se fazer essa remoção pelo menos até o exame completo da questão. O TJRJ afirmou que o pedido ser direcionado apenas contra o Google não diminuiria a sua legitimidade "porque as buscas realizadas dentro de aplicativos como Facebook, Instagram etc. não costumam apresentar um resultado tão preciso e detalhado quanto as buscas realizadas na pesquisa Google que se destina exclusivamente a esse fim". Liberdade de expressãoO caso da atriz também envolve o debate sobre liberdade de expressão e de imprensa. O tribunal observou que, embora a liberdade de imprensa seja essencial, ela tem seus limites e não deve ser usada para disseminar informações falsas ou prejudicar a reputação de alguém. Segundo a decisão, esse tipo de matéria não é "informação que mereça proteção sob o escudo da liberdade de expressão ou de imprensa". Pesou na decisão do tribunal o fato de a atriz ter sido atacada e recebido diversas críticas nas redes sociais depois da veiculação das matérias nos sites. Em um dado momento, a decisão passa a criticar a postura das pessoas que se mobilizaram nas redes sociais para cancelar Marcius Melhem e, consequentemente, atacar a atriz a partir das manchetes distorcidas dos sites de fofoca. Nesse particular, o desembargador identifica uma contradição entre a "postura de perseguição" com o acusado de assédio e a tolerância com relação a práticas de políticos. A decisão não cita nomes, mas parece clara a referência às condenações do presidente Lula em ações penais, posteriormente anuladas pelo STF. Ao discorrer sobre liberdade de expressão no caso da atriz Letícia Spiller, a decisão do TJRJ acaba afunilando para uma discussão sobre cultura do cancelamento, empatia e censura. Não deixa de ser pertinente apontar como uma controvérsia sobre a desindexação de resultados de busca acabou inserida em um contexto mais amplo e complexo. De certa maneira —e cada vez com mais frequência— as percepções sociais e políticas dos magistrados vão ser ativadas em casos que envolvem liberdade de expressão. |
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