Anti-modaCheugy, Instagram-raiz, Paulo Mendes, turismo da vacina, Mariah Carey, astrologia e isolamento social realEu já tenho idade para entrar na vila da vacina com comorbidade, o que quer dizer que não tenho idade para TikTok. Sou mais de comentar os melhores momentos da CPI no Twitter do que de ficar vendo dancinha apontando para aforismos de empoderamento feminino. Mas veio do TikTok um conceito que nós como sociedade nem imaginávamos que precisávamos, e eu não vou me furtar a abrir a mente para as modernidades que a juventude nos trás. Segundo o New York Times, a ideia de cheugy nasceu nos corredores de um colegial* qualquer em Beverly Hills em 2013, mas ganhou tração e atenção nos últimos meses através da rede social dos jovens. Nem o prestigioso jornal americano soube definir exatamente o que é cheugy, mas deu uma pista:
O The New Daily define cheugy alguém 'que pensa que está na moda enquanto se mantém alegremente inconsciente do quão uncool é'. Um eterno esforço para estar na crista da onda. E tá tudo bem! Ser cheugy não é um demérito para ninguém e todos nós temos um pouquinho. Acho tão engraçado que um termo desses tenha emergido justo em uma época em que morrem pessoas aos milhares todos os dias, a engrenagem do mundo rodou para trás e a sociedade como conhecemos está despedaçada. Seguir tendências cansa, dá um trabalho desgraçado. Depois de mais de um ano trancado em casa, vendo a vida deteriorar e a democracia derreter pela TV, quem tem energia sobrando para gastar com isso? Quem ainda se preocupa com o que é trendy, ou ainda pior, com o que já não é mais? Sejamos francos: estar na moda é algo que fazemos mais para os outros do que para nós mesmo. E se você segue isolado, sem encontrar família e amigos em nome da vida, provavelmente você largou mão da moda já faz tempo. Viva o combo calça de moletom + pantufa! A vida para os outros só continua acontecendo nas redes sociais, essas pedrinhas de crack digital que nos transforma em zumbis da inveja da vida alheia. Mas o que já parecia maculado agora apodreceu de vez. Gente linda em paisagens de sonho, frases de efeito cunhadas de uma filosofia de shopping (ou de um coach), auto-afirmação de resiliência e aprendizado… Quem é essa gente perfeita que não lê o jornal? Se tem um aprendizado que a pandemia deveria nos oferecer é que a vida é realmente frágil, e que só encontramos sentido mesmo nas pequenas coisas do dia-a-dia. Sem festas de casamento, viagens idílicas e reuniões de família e amigos, só podemos buscar alegria nos pequenos afazeres que na ‘vida normal’ fazemos no automático, sem registrar. Cozinhar algo gostoso, deixar a casa arrumada, criar manhãs tranquilas, pisar na grama, sentir o sol e a brisa no rosto. A Amanda Foschini, uma das pensadoras da modernidade que mais gosto hoje em dia, perguntou outro dia onde anda o Instagram-raiz. Sabe o Instagram oldschool, aquele que a gente tirava umas fotos cagadas com o celular ruim, tacava uns filtros e umas bordas de gosto duvidoso, e postava qualquer coisa que desse vontade? Aquela rede social que era só um balaio de fotos de amigos, sem curadoria, sem métricas, sem algoritmo. Lá em 2010 (nem faz tanto tempo assim), a gente socializava sem ter que ter propósito para tudo. Sem ter que se preocupar com o objetivo da mensagem, a precisão da linguagem ou o medo do cancelamento. Sou apoiador do #instagramraiz, sim! Quero mais é foto de bicho, de drink, de perna de salsicha, de planta, e por-do-sol. Chega de produção para tudo, bora viver mais leve. Bora deixar de lado as tendências e as não-tendências. O cool agora é ser real. É ter ansiedade, dente torto, medo da morte, espinha na cara, chefe mala, problema de concentração e uma segunda-feira difícil, e ainda assim estar feliz. Cheugy agora é querer ser perfeito. Talvez a Luana Piovani tivesse razão e a gente não percebeu. *usar esse linguajar configura comorbidade? Tendência para mim é pensar como fazia o mestre Paulo Mendes da Rocha, que faleceu no último domingo. Esse, sim, sabia o que era ser chique de verdade. Com grande parte da população vacinada, cidades como Nova York e Miami começam a usar o estoque de vacinas para atrair turistas. Mas afinal, viajar para tomar a vacina em outro país é de bom tom? Pode ser legal, mas também é cafona e elitista. E usar vacina como estímulo para economia é imoral. Essa história sobre o disco secreto de rock alternativo que a Mariah Carey gravou quando estava no topo das paradas com seu pop meloso é o motivo para eu pagar para ter internet. Astrologia é cheugy demais-da-conta, mas também é irresistível. A Natalia Baffatto seus poderes esotéricos para contar lá no CoP qual é o destino de viagem pós-pandemia certo para cada signo. Se joga, jovem místico! Trendy é seguir protocolos de segurança de verdade. E passar uma temporada numa casa construída em cima de uma árvore, no meio da natureza, é o mais cool que você pode ser até o fim dessa pandemia. Eu demorei muito para escrever essa newsletter, porque a vida não tá fácil e eu sei que você me entende e perdoa. Mas se você gosta muito de receber a Chicken Wings no seu email, e quer que a gente não fure mais, escreve para nós. Estamos loucos para saber o que você pensa sobre o que escrevemos, e queremos bater um papo! Vacina já! Bom fim de semana! Comentários, elogios, sugestões, críticas e conversas aleatórias, mande um email para nós: hello@chickenorpasta.com.br Se você gostou da nossa newsletter Chicken Wings, compartilhe com os amigos! |
sexta-feira, 28 de maio de 2021
Anti-moda
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