O britânico Martin Sorrell é um dos maiores nomes da publicidade mundial. Fundador do WPP, o maior grupo de propaganda e marketing do mundo, ele deixou a companhia em 2018, após 33 anos no comando. Quando esperava-se que o executivo, na época com 73 anos, se aposentasse dos negócios na publicidade, Sorrell surpreendeu ao fundar o grupo S4 Capital. O S4 também fica dentro da comunicação, mas em um formato de negócios diferente do WPP (e dos outros grandes grupos de comunicação). A aposta dele, agora, é em performance digital, e não mais na publicidade "tradicional". Em menos de três anos de vida, o S4 tem mais de 3.000 funcionários, divididos em empresas de tecnologia, dados e criatividade, com clientes como P&G, Whirlpool, BMW, L'Oreal e Uber. No Brasil, o S4 atua com as agências Circus, MediaMonks e MightyHive. O executivo conversou com a newsletter UOL Mídia e Marketing sobre os rumos dos negócios da comunicação no mundo. E contou se acredita que a propaganda como conhecemos hoje está com os dias contados. UOL Mídia e Marketing - A pandemia acelerou transformações, principalmente digitais, em quase todas as indústrias. Quais foram as mais importantes no mundo dos negócios da comunicação? Martin Sorrell - A pandemia nos afetou em três níveis. O primeiro, no ponto de vista de consumo. A população passou a usar muito mais o online. Na América do Norte, por exemplo, aproximadamente um terço das famílias começou a usar o e-commerce pela primeira vez para praticamente tudo. O padrão de vida dos consumidores mudou. O segundo é o impacto na mídia. Serviços de streaming, como Netflix e Disney+, tiveram ganhos muito significativos. A Disney+, por exemplo, teve um dos lançamentos de produtos mais relevantes de todos os tempos e já prevê 250 milhões de assinantes até 2024. Por outro lado, jornais e revistas em sua forma tradicional continuam em declínio. O outdoor tradicional continua sofrendo. Em terceiro lugar, e mais importante, o impacto nas empresas. As companhias que hesitaram em implementar a transformação digital estão agora definindo seus agentes de mudança. A covid-19 abalou o modelo corporativo e incentivou que as empresas buscassem mudanças radicais. São tendências que existiam antes, mas que foram aceleradas pela covid-19. Provavelmente teremos um ano tão difícil quanto foi 2020. O que ficou de lição do ano passado para 2021? Acho que 2021 será um ano de recuperação. Embora haja problemas, com mutações de vírus e lançamentos de vacinas, estaremos em uma melhor posição no final do segundo trimestre. Veremos uma recuperação significativa do PIB (Produto Interno Bruto) globalmente em 2021, e novamente em 2022. Eu me preocupo com as implicações do custo de tudo isso depois de 2022. Será relativamente mais difícil para alguns países, os que chamo de 'mercados de crescimento rápido', e outros, de 'mercados emergentes'. Um dos problemas da covid-19 é que ela afeta a todos, mas de forma desigual. Dentro das nações, as pessoas com mais recursos são privilegiadas. Entre as nações, os países mais ricos também são favorecidos. Assim, haverá alguma irregularidade nesta retomada das economias, com as nações mais ricas se recuperando mais rápido. Também é claro que a China parece ter se recuperado mais rápido do que os demais países, tendo crescido 2% em 2020. As empresas faziam planos de 3 ou 5 anos, e agora têm de fazer com prazos de 3 ou 5 meses. Por outro lado, a publicidade sempre foi muito burocrática. Agências tradicionais poderão perder o reinado com essa mudança? Sempre acreditei que um plano de longo prazo é a chave. Nosso plano é construído em torno apenas do digital. Nosso modelo segue a "Santíssima Trindade" de dados primários, conteúdo digital e mídia digital, de acordo com o nosso mantra de "mais rápido, melhor e mais barato". Algumas das coisas que estamos fazendo no Brasil e na América Latina mostram nossa abordagem. Um exemplo são as práticas de empresas 'in-house', quando anunciantes montam agências de comunicação internas. No Brasil, temos uma parceria com as Havaianas, por meio do Hana Studio, construída para ajudar a marca a aumentar e otimizar seu conteúdo digital de forma criativa e mais eficaz. Essa parceria começou no Brasil e agora está se expandindo para outros mercados, como México, Estados Unidos e até a China. A parceria entre a MediaMonks e o Mercado Livre também é um bom exemplo. Estamos construindo páginas específicas para marcas dentro da plataforma de comércio eletrônico. Essa iniciativa pretende proporcionar uma melhor experiência para o consumidor. Pouco mais de dois anos após deixar o WPP, o senhor é dono de um grupo que tem feito seguidas aquisições pelo mundo. Qual o tamanho desse apetite e onde o Brasil está nesse tabuleiro? Cerca de 70% a 75% de nossos negócios vêm das Américas [do Sul e do Norte]. Apesar de termos apenas dois anos, a América Latina se tornou uma parte muito importante da nossa operação. A região terá um papel muito importante, principalmente pela capacidade do povo latino-americano em distribuir seu talento para o mundo. O Brasil e a América Latina continuarão sendo centros de excelência tecnológica e criativa. Nossa indústria não entende de fato quão forte é o talento na região. Do meu ponto de vista, prefiro que continuem a subestimar esse talento, enquanto nós vamos nos beneficiar disso. Algumas agências estão revendo seus formatos de negócios. Como o senhor acredita que será este futuro? A criatividade ainda está acima de tudo? Eu não sei o que esse modelo de "pós-agência" significa. Aqui, estamos focados em criar um modelo de serviços de publicidade e marketing para a nova era, rompendo com o modelo antigo, que existe há 70 anos, e que não é mais adequado para a atual dinâmica dos negócios. É necessário criar uma abordagem apenas digital, mais ágil e eficiente. Isso é o que estamos fazendo: usando dados dos clientes, dentro das regras, para alimentar a criatividade e distribuir conteúdo por meio de mídias digitais de uma forma eficaz. É um modelo interativo e baseado numa contínua melhora, em tempo real.
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