A próxima Olimpíada de Verão será na Europa, em Paris, em 2024. A seguinte, na América, em Los Angeles, em 2028. Depois é a vez da Oceania, com Brisbane, na Austrália, em 2032. Mantendo o rodízio que vem sendo adotado pelo Comitê Olímpico Internacional (COI), em 2036 a competição vai passar de novo pela Ásia. E ninguém, na Ásia, quer mais receber os Jogos Olímpicos do que o Qatar. Doha se apresenta como candidata a sediar uma Olimpíada desde 2009, até agora sem conseguir avançar à fase final da concorrência. Mas, por 2036, a disputa será bem menos acirrada. Os três principais países da região — China, Japão e Coreia do Sul — acabaram de sediar edições de Verão (Pequim-2008 e Tóquio-2020) e de Inverno (Pyeongchang-2018 e Pequim-2022). Por isso, em tese, estão descartados. Em abril, o jornalista britânico Duncan Mackay, editor do "Inside The Games" e repórter de maior conhecimento sobre o movimento olímpico, escreveu sobre essa possibilidade. "Doha vem batendo cada vez mais forte na porta do COI há quase uma geração. Não surpreenderia ninguém se, para 2036, Bach entregar as chaves", informou Mackay, citando que o presidente do COI, Thomas Bach, tem seu último ano de mandato em 2025. Na década passada, o movimento olímpico foi recusado pela população de mais de uma dezena de cidades e países, que pressionaram seus governos para a retirada de candidaturas. Quase ninguém queria ser sede da Olimpíada e, por isso, os Jogos de 2024 e 2028 foram atribuídos a Paris e Los Angeles de uma só vez. Em 2019, as regras do processo seletivo foram mudadas, com a aprovação da "Agenda Olímpica 2020", que flexibilizou as exigências do COI para as cidades candidatas. Em 2021, um grupo de trabalho entendeu que Brisbane tinha a melhor proposta para 2032 e, depois, a opção foi referendada pela Assembleia do COI. Oficialmente o processo de candidatura para 2036 ainda não foi aberto, mas Doha sem dúvida será candidata, como tem sido regularmente. Não é à toa que os qataris têm levado para lá Mundiais dos mais diversos, como os de handebol masculino (2015), ginástica artística (2018), atletismo (2019), judô (2023) e natação em piscina curta (2024). Nenhum dos eventos já realizados atraiu estrangeiros em número significativo, nem encheu arquibancadas com a população local. Mas todos serviram para estreitar laços com o movimento olímpico e exatamente com as quatro federações mais poderosas: atletismo, ginástica, esportes aquáticos e futebol. A forma como o COI escolheu Brisbane, candidatura ligada a John Coates, vice-presidente do COI e aliado de primeira hora de Bach, mostrou que as boas relações com a cúpula do Comitê são mais importantes do que nunca para quem quer sediar uma Olimpíada. "Bach sabe tudo sobre os influentes vínculos comerciais do Qatar, já que por muitos anos foi presidente da Ghorfa, a Câmara de Comércio e Indústria Árabe-Alemã, deixando o cargo apenas em 2013", escreveu Mackay. De fato, deve ser tentador levar uma Olimpíada para o Qatar. É a certeza de que tudo será construído da forma como querem as federações internacionais, e que não faltará dinheiro para os eventos-teste, ou para as mordomias da "família olímpica" (ou seja, os cartolas). Mas a Copa do Mundo tem mostrado que isso não é o bastante. O episódio da proibição da venda de cervejas é só um exemplo, menos pelo álcool, mais pela demonstração de que os preceitos religiosos se sobrepõem aos interesses comerciais por lá. Pior é a ameaça legal aos LGBTQIA+, e o ambiente muito pouco confortável para as mulheres — vale ler o relato do colega Diego Garcia, que está no país do Mundial, e assistir ao documentário "A convite do Qatar: a visão feminina sobre as restrições no país da Copa", do UOL Esporte. Isso sem contar as denúncias de exploração de mão de obra barata de estrangeiros. Se nada disso servir, que sirva a imagem de metade das cadeiras da arquibancada vazias no jogo de abertura da Copa, ou dos relatos da falta de calor humano nas ruas. A Olimpíada merece coisa melhor que Doha. |
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