Sexta-feira, véspera de feriado. Sinônimo de folga, e olha que tem gente precisando muito dela. São os investidores de Natura e Magazine Luiza, empresas cujas ações derreteram nesta sexta, após a divulgação de resultados bem piores que o esperado pelo mercado financeiro. Mas a preocupação não é só desses investidores. A verdade é que os resultados dessas duas empresas foram os mais eloquentes para avisar que as grandes empresas não estão imunes à piora da economia brasileira.
Até o ano passado, parecia que as ações da Magalu tinham uma única direção: para cima. Bem, para uma empresa que chegou a se valorizar mais de 5.000% desde o IPO, dava para entender. Em 2021, porém, o cenário mudou brutalmente. A companhia acumula queda de 50% e os resultados do terceiro trimestre não ajudaram a estabilizar os ânimos dos investidores.
O lucro da companhia caiu 30% no terceiro trimestre. O resultado verdadeiro da companhia foi ainda pior. É que o lucro acabou turbinado por créditos tributários – se a empresa não tivesse contado com essa forcinha, o tombo teria sido de 90% no lucro. Os acionistas reagiram mal a esse resultado: queda de 17,73% nos papéis da varejista, o maior tombo do dia.
O desempenho foi pior nas lojas físicas, onde o faturamento recuou 8% – sem as unidades novas abertas no período, a queda foi de quase 15%. Segundo a companhia, o varejo físico atende a um público mais sensível à crise que se instala sobre o país. Em contrapartida, o e-commerce se saiu bem melhor e cresceu 22,2%, mas não o bastante para compensar o estrago.
E bota crise. Na carta a investidores que acompanhou a divulgação de resultados, a companhia afirmou que "uma tempestade perfeita se armou sobre a economia brasileira. As nuvens se formaram surpreendentemente rápido. A inflação disparou, fazendo com que os juros chegassem ao maior patamar em quatro anos. O atual cenário econômico é turbulento e desafiador para as empresas que atuam no mercado interno e, particularmente, no varejo – e deve permanecer assim, pelo menos no curtíssimo prazo".
Estamos falando de uma alta de preço de 10,25% nos 12 meses encerrados em outubro, quase tão alta quanto a inflação registrada no pior momento do governo Dilma. Nisso, o Banco Central precisa subir os juros para enxugar o dinheiro da economia e conter a sanha inflacionária. O efeito colateral desse remédio é deixar o crédito mais caro, e inibir as compras.
Quem sofre não são só as geladeiras, mas qualquer coisa que não seja considerada consumo essencial, como é a comida.
Aqui entram maquiagens e perfumes da Natura, que amargou a segunda maior queda do dia na B3: -16,62%. Pudera, o lucro da empresa tombou 28,5% no terceiro trimestre quando comparado com igual período de 2020 – foi para R$ 272,9 milhões. A receita caiu 4,2%, chegando aos R$ 9,5 bilhões.
Hoje, mais de 70% das receitas da companhia são geradas no exterior. Ainda assim, a culpa do resultado ruim que destroçou o balanço da companhia foi o do Brasil. Por aqui, o faturamento caiu entre 15% e 20%, considerando Natura e Avon. Além dos problemas econômicos, a companhia ainda padeceu da falta de suprimentos para seus produtos, um fenômeno global que afeta de carros a computadores, passando por outras indústrias, como a de cosméticos.
Outro fenômeno que abalou a confiança dos investidores foi o anúncio de que a companhia pretende deixar a B3 e migrar para Nova York – tem mais gente nessa fila, como o Inter, a Americanas e a Locaweb. Ter ações lá fora ajuda a atrair investidores gringos, que têm mais dinheiro que o brasileiro, ainda mais agora que a B3 entrou em um inverno fora de época.
Nem a notícia que poderia ser boa acalmou os investidores. A Natura anunciou um programa de recompra de ações, algo que empresas costumam fazer quando estão dando lucro e acreditam que o mercado financeiro não está avaliando corretamente o valor da companhia. Nisso, a tendência é que os papéis reajam positivamente. A Natura vai comprar até 4,4% das suas ações.
Natura e Magalu fazem parte de um segmento chamado de consumo cíclico. Elas dependem do crescimento da economia – e para o próximo ano, o cenário é ainda pior. Economistas esperam que o crescimento ficará abaixo de 1%, com risco real de voltarmos à recessão.
Pé frio da temporada
Até semana passada, quem olhava para os resultados das companhias poderia até achar que as grandes empresas do país conseguiriam passar ilesas à tormenta que se avizinha. De acordo com a XP, até o dia 7 de novembro 60% das empresas do Ibovespa já tinham divulgado os seus balanços. E 76% deles estavam acima das expectativas do mercado.
Mas agora, já no fim da temporada, os investidores começaram a levar sustos como os de hoje e ontem. Se você não acompanhou o fechamento de ontem, a gente te situa: a Via (antiga Via Varejo) ficou meio que na mesma. Teve lucro de R$ 101 milhões, o que representa uma alta de 1%. O Ebitda foi um pouco melhor, com alta de 6,7%.
O problema é que, além de estar abaixo do esperado e de sofrer com a inflação, a empresa separou R$ 1,2 bilhão para arcar com processos trabalhistas. E ela já tinha outros R$ 1,3 bilhão reservados para isso. Bom, as ações da companhia caíram mais de 12% na quinta-feira.
A exceção
O surpreendente do pregão é que a ponta positiva do Ibovespa ficou também com empresas ligadas a consumo: Americanas (ex-B2W) e Lojas Americanas. O lance é que as duas empresas estão no meio de uma reestruturação dos negócios, anunciada no final do segundo trimestre. Nisso, as duas empresas começaram a colher frutos de mudanças no negócio que a Magalu fez lá atrás (como a integração das lojas online e física, por exemplo). Daí esse cenário quase distópico de ver Americanas no pódio de maiores altas, ao mesmo tempo que a Magalu acumula a maior queda.
Pode piorar
O setor de serviços, que mais padeceu do isolamento social, vinha se recuperando. Mas, em setembro, tropeçou justamente por causa da inflação. Foi uma queda de 0,6%, segundo o IBGE, a primeira depois de cinco altas consecutivas. Para piorar, economistas esperavam uma alta. E faz sentido: se a grana tá curta, você come em casa, e não no restaurante, e a sonhada viagem fica para uma próxima. Nisso, a economia vai definhando e as ações também. Resultado: o Ibovespa caiu 1,17%, aos 106.334 pontos.
Ainda bem que existe feriado. Até semana que vem ;)
Maiores altas
Americanas (AMER3): 5,66%
Lojas Americanas (LAME4): 5,45%
BR Malls (BRML3): 3,99%
Carrefour (CRFB3): 3,03%
Petrobras (PETR4): 2,68%
Maiores baixas
Magazine Luiza (MGLU3): -17,73%
Natura (NTCO3): -16,62%
Meliuz (CASH3): -9,84%
CVC (CVCB3): -9,34%
Locaweb (LWSA3): -8,61%
Ibovespa: -1,17%, aos 106.334 pontos
Em NY:
S&P 500: 0,72%, aos 4.682 pontos
Nasdaq: 1%, aos 15.860 pontos
Dow Jones: 0,50%, aos 36.100 pontos
Dólar: 0,98%, a R$ 5,4569
Petróleo
Brent: -0,84%, a US$ 82,17
WTI: -0,98%, a US$ 80,79
Minério de ferro: -3,11%, US$ 89,69 no porto de Qingdao (China)
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